IMPETUOSO
IMPROVISO
Raiam nas colinas dóceis dos verdes anos
Os reflexos das salinas sob esse sol divino,
Quase ventres de meninas em alvos panos,
Velas em X de ansiar pra cumprir destino.
E têm seu jamais escrito pela imediata tinta
Dos pontos cardeais num sorriso encantado,
Como quem à incerteza dribla com a finta
Da meiguice gingada dum biquíni molhado...
Declaro para mim breve ser, só doçura leve.
Que não cederei ao repentino, e ao espanto
De quem pelo temor d'esquecer o escreve;
Mas a brisa segreda-me ser tarde pra ser
santo...
E aí o vento do desejo sopra forte, fero e
tanto
Que a declarada intenção de nada me serve!
Joaquim Castanho
O POETA
Michael Connelly
Trad. Eduardo Saló
480 Páginas
"A escrita exerce em mim o mesmo efeito que o
conteúdo desse copo em ti. Se conseguir escrever sobre o caso, é porque o
compreendo. Nada mais me interessa."
"Queria ser escritor e afinal tornei-me
jornalista."
"Uma pessoa tenta reconstruir um puzzle em
conformidade com o que tem na mente."
"– Vou escrever sobre o meu irmão – anunciei.
(...) Depois disso tudo se alterou na minha vida."
"A morte é o meu negócio. É dela que vivo.
Baseia-se nela a minha reputação profissional. Trato-a com a precisa paixão de
um agente funerário – grave e consolador perante os enlutados e artesão
eficiente com ela, quando estou só. Sempre achei que o segredo para me ocupar
da morte consistia em a manter a uma distância prudente. É a regra de ouro. Não
permitir que o seu alento me atinja a cara."
Sob o modelo narrativo das "bonecas
russas", matrioskas, ou das caixinhas que têm uma caixinha dentro que têm
outra caixinha, e por aí fora, até desvendar todas as peças do puzzle num
quadro geral, este romance assenta, contudo, numa estrutura molecular poeniana,
cujos pilares, ou formas essenciais (e explícitas) são: A Queda da Casa de Usher – conto que gira à volta da temática dos
sepultados vivos, vítimas dos seus antecipados terrores – e da poesia do mesmo
Edgar Allan, principalmente do poema País
dos Sonhos, e no qual, aliás, vem a residir a chave do enigma policial, num
enredo aos socalcos, em que, a cada nível, se tenta colocar o leitor "fora
do espaço, fora do tempo", tornando-lhe as conclusões obsoletas na justa
medida em que a elas chega, demonstrando uma vez mais que em poesia uma coisa é
sempre outra, qual encadeado metafórico cujos limites não cabem na ideia que
possamos ter de infinito, pois que, invariavelmente, logo que compreendemos
algo, outro algo se eclode na nossa compreensão, exigindo imagética realização,
ao contrário da Dicotomia de Zenão,
onde para se alcançar um objectivo depois de percorrido metade do trajeto ainda
faltará outro tanto, tornando a demanda impossível, porquanto esta compreensão
é heurística mas aberta, visto qualquer descoberta (ao entendimento) não ser
mais que o impulso direto – e motivador – para nova descoberta.
Enfim, um livro que só lido, pois que contado vamos
obrigatoriamente baralhar-nos nos enredos, enredados na trama e… tramados. Ou incomunicativos.
Joaquim Castanho
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