2.02.2011

O Rio do Silêncio

Eu devia estar meio louco
Quando parti assim sozinho de bicicleta
Pedalando em direção aos trópicos levando comigo
Um medicamento para o qual ninguém achara ainda
A doença e esperando
Chegar a tempo

Passei toda uma aldeia de papel com vidro por cima
Onde os exploradores pela primeira vez encontraram
O silêncio e o ensinaram a falar
Onde os velhos ficavam sentados à porta
De casa matando sem piedade a areia

Irmãos gritei-lhes
Digam-me quem levou daqui o rio
Onde vou achar agora um sítio bom para me afogar


In O Deserto Tatuado, de Richard Shelton



Descobri – finalmente: vale mais tarde do que nunca! – porque é que as minhas crónicas não tiveram (e não têm) qualquer êxito, nem o meu discurso o mínimo sucesso: porque não me drogo, porque não sou alcoólico, porque não cultivo nem pratico as relações homossexuais, pedófilas e derivadas, porque não frequento as missas secretas (brancas nem negras), porque não participo nas orgias das seitas secretas da caridadezinha e da falcatrua organizada, porque não mergulho nos rios sujos para provar que estão limpos, e subscrevo ou afirmo conceitos em vez de enumerar medidas de valor com baboseiras do tipo muito e pouco, melhor e pior, mais e menos, contente e zangado, que (se) transcrevem, por relativo e miúdo, por grosso e atacado em absoluto, nos bonequinhos dos emoticons do msn. E tenho parágrafos em vez de frases avulsas espalhadas aleatoriamente pelo “retângulo relvado” de um A4 suficientemente limpo de grafites e dichotes em que se possa escrever. Ou ouso mencionar arrelias e desmandos que os elementos do kremlin social, como nata das várias fações em vigor, preferem esconder, esquecer e até negar.
E não olvidei que quase tudo aquilo quanto nos ensinaram está agora errado. A vida não era aquela pasmaceira sem condimentos de risco desde que nos não metêssemos em política, conforme afiançaram as hostes hostis ao progresso, nem a imutabilidade das coisas a que só Deus estipulava a ordem, nomeadamente no tempo (meteorológico), que não era assim tão imutável como se supunha, pelo menos se atendermos às evidentes alterações climáticas, para as quais nem os modelos matemáticos estão convenientemente preparados ao nível das previsões. A sociedade dos bem pensantes e melhor vistos, sequer se avizinhava aos ideais idealistas, e se primou em alguma coisa, foi em demonstrar ser exatamente o contrário daquilo que propalou ser – bem-pensante, realista e com intenções claras e esclarecidas, ou bem-intencionada. A Igreja de imaculada não tem absolutamente nada, excepto o silêncio, que é uma forma milenar de santificar a ignorância e estuporice, que os tabusistas e tabulageiros epitetam também de sábio, esse mesmo silêncio corporativista com que cala e alimenta os diversos pedofilismos ou abuso sexual de crentes, alimenta a generalizada hipocrisia e imita os camaleões na tentativa de adaptar-se às circunstâncias mundanas e continentais. A banca não é minimamente confiável, e a desgraça que nos assola tem a sua inteira responsabilidade. O ensino não ensina, ou se ensina, aquilo que transmite não serve para ninguém, a não ser para justificar o ordenado de quem o veicula. A sabedoria e a cultura não eram aquelas diatribes afectadas, enciclopédicas e elitistas que os misóginos e pedantes divulgavam e imprimiam ao quotidiano comum. Os criminosos e os fora-da-lei são muito mais parecidos com as forças da ordem e da lei do que com os cidadãos vulgares da nossa rua. Os meios de comunicação estão mais empenhados em deformar do que informar. E a solidariedade é um negócio profícuo e generoso para quem o cultiva, desfruta e explora.




Mas de entre as eternas verdades nascem e se alimentam as eternas mentiras. Os sábios capricham nas intervenções tentando espionar o que pensam os deuses, esquecendo que estes seres mitológicos e fantásticos não existem, a não ser na imaginação de quem neles acredita. De quem os cria para solucionar as suas incapacidades e problemas. E, acerca do cada qual, ou quais, nomeadamente dos mais chegados, prestáveis e lisonjeiros, há sempre alguém que desconfia das suas intenções por projeção, transferências de carácter e natureza. Principalmente quando diz ter ouvido na comunicação social algo que não conjuga com a prática a que assiste ou até é sujeito. Por exemplo, como sucedeu e sucede com os Atestados Clínicos de Incapacidade, em que noticiou que este passava de 0,90€ para 50€, o que é uma descarada mentira, porquanto eu paguei esses 0,90€ mais os 50€, ou seja 50,90€, pois devo valer por dois ou coisa no género, uma vez que me aplicaram primeiro a legislação antiga e depois a nova, segundo rezam os recibos, aplicando-me a “Lei 150/99” e o “Decreto Lei 8/2010”, conforme se pode ver nos recibos ou na digitalização dos documentos da ilustração, dando relevo ao que se suspeitava, que é para contrabalançar com aqueles que fogem à Lei e não a cumprem, pondo outros a cumprir duas leis sobre o mesmo item, pagando a dobrar, a ver se esperta e abre os olhos, pois ninguém o manda ser diferente, e não tinha nada que apanhar uma poliomielite quando era pequeno, só para chatear (e desmascarar) quem não o vacinou contra ela antes dos três anos de idade, que é uma idade mais que boa para se ser responsável por si mesmo, e já que ninguém o vacinava, devia ele próprio dirigir-se a quem e onde isso fosse possível. Exatamente, que essa corja dos deficientes motores são é uns vadios e sabichões que merecem pagar a dobrar, que nunca dão ponto sem nó, e se calhar já contraíram as deficiências só para os sãos e desenxovalhados arcarem com o seu sustento e tratamentos.



Ora, neste sem-tirar-nem-pôr com que os fatos concretizam os assuntos, é inegável que quando alguém nos leva duas vezes o custo de um serviço que apenas se efetuou uma vez, mesmo que esse alguém seja parte consciente de quem fez a Lei que depois aplicou, outros dirão, espécie de juiz em causa própria, o que parece evidente, sem a mínima dúvida, é que alguém anda a meter as mãos pelos pés, e a castigar pelo crime de existir quem não tem a menor culpa dessa falta. (Pelo menos dessa não tem!) Desse pecado mortal, pelo qual tenho que pedir desculpa continuamente, dia a dia, nos transportes públicos, nas instituições com acessos em socalcos, com os vizinhos e familiares que veem em mim um privilegiado matreiro, que até sabe ler e escrever, mas que não quer é trabalhar, só ronha, é o que é, e demais brindes e presentes que me são oferecidos quotidianamente e nas mais diversas e insuspeitas oportunidades.
O que me torna, aliás, extraordinariamente orgulhoso da minha incapacidade, considerando que ela me faz diferente, e diferente sobretudo, das pessoas que não tendo sofrido poliomielites aos três anos, se acham suficientes e capazes de assim arremeter contra aqueles que as sofreram, já que uma vez que sobreviveram àquilo que ninguém queria que viessem a sobreviver, então têm que pagar por isso, e bem caro, de preferência a dobrar, que é para aprenderem a não desrespeitar as superiores ordens de Deus, do Destino e das Famílias disfuncionais. Pois, que é para aprenderem a comer e ficarem calados, no silêncio dos culpados, cujo rio possui as águas que lavou as mágoas da cidade com a lixívia da vingança e do ressentimento, da contradição e do ódio sobre quem menos pode e nada deve.
Perguntas, irmão quem levou o rio onde te querias afogar? Descansa, não te atormentes mais, ele continua a correr, apenas o mudaram de sítio. O seu leito já não são os apartheids de e entre um lado e o outro, incluindo o sul-africano… é (e são) aqui, neste quadradinho à beira-mar plantado em que agora as suas águas salpicam quem se senta nas margens do seu curso, com a espuma dos cachões, e dos rápidos, na corrente dos TGV da modernidade. Engenharias!...

La vida es un tango y el que no baila es un tonto

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Dos calhaus da memória ao empedernido dos tempos

Onde a liquidez da água livre

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Também pode alcançar o céu

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