8.16.2005

Fragmentos do dizer

4.

Haverá um lugar onde nada é tudo
Aquilo que nos acontece é sempre sinal
De outro tanto interpretável à luz fria
Transparente do facto no espelhado reflexo
Ou água de mistério no olhar de um rio
Na subterrânea cave dos sentimentos, as rosas
Eriçam seus espinhos de sangue coagulado…

Mas na orla do tempo que se vê escorrer
Como um mar esmaecido pela voz das profundezas
As barcas nas correntes lisas ante a praia
Os remos de abraçar forças desaçaimadas
O simples gesto da foz escolhendo murmúrios
Ou o compósito da tarde no solfejo do ocaso
Brilha lazarento para lavar-te os pés nus
Empresta à espuma uma solidão efervescente
No regaço dos dedos sob a sombra das unhas
Pintadas de carne apagada ou lava encarnecida.

Não, a insistência não modifica a gente
Apenas empurra quem já de si quer ser
E sendo evolui tornando-o diferente
Ajusta, acerta, aponta, afina o querer
Para somar vitórias, seguir em frente.

Porque é aí, entre perguntas e resposta
Viradas prò desígnio de quem se aposta
Que a árvore se faz folhas, ramos, tronco, poesia
E do dizer a alma nasce também o dizer da magia...

5.

Distribuo-te pelos meus versos
Como se fosses o sal que os tempera
A verdade insuspeita que os habita
A cor que matiza a fala simples
O nome insurrecto que teima em permanecer
Mesmo muito depois de ser dito, repetido e redito
Confrontado com o seu eco no desfiladeiro do meu desassossego
Que vocifera o receio da alma na certeza que a desmente.

Viver é ter um grande amor e ser-lhe fiel
Até ao limite de todos os limites inclusive
Este: o de alguma vez tentar sobreviver-lhe.

Portanto, quando sentes familiares os meus versos
Assim como que inscritos no íntimo secreto da voz
A germinar químicas soluções para a refracção do desejo
Ou a contemplar o manso exemplo da luz nos contornos do dia,
Tens toda a razão: porque eles falam sim falam do ser
Do amor que é a nossa casa, quarto, sala comum
Cozinha de confeccionar o quotidiano na originalidade de cada segundo.

Falam de sentir prazer em dar prazer
Em naufragar nas ondas tempestuosas do sonho
Surfar nas linhas das mãos e escalar teus lábios
Ou na alpinia de escutar os segredos do tacto.

Sem comentários:

La vida es un tango y el que no baila es un tonto

La vida es un tango y el que no baila es un tonto
Dos calhaus da memória ao empedernido dos tempos

Onde a liquidez da água livre

Onde a liquidez da água livre
Também pode alcançar o céu

Arquivo do blogue

Acerca de mim

A minha foto
Escribalistas é órgão de comunicação oficial de Joaquim Maria Castanho, mentor do escribalismo português