5.11.2015

FUGIR AO TEMA



crónica da semana:

FUGIR AO TEMA


Confesso que o objetivo de hoje, por ser uma segunda-feira de rapapés, a que antigamente chamavam dia de sapateiro, logo atreito a muita martelada na sola, era o de escrever sobre cidadania. Mas meti baixa-ética, pelo que vou falar doutra coisa qualquer. O rendimento é subsuficiente, os amigos são uns batidos e o empreendedorismo, com as bases enunciadas, é pouco prometedor. Além do mais, os mecenas andam a treinar manguitos para estarem em forma nas próximas legislativas.

Porque há uma estrondosa diferença entre ser-se democrata e lutar-se pela democracia. E não é só conceptual: a segunda exclui a primeira, e esta não admite a segunda; ou seja, é totalmente adversa à imposição de algo superior sobre aquilo que é inferior. Aliás, quem lutar contra ou favor do quer que seja em termos e moldes democráticos, respeitando o adversário na sua dignidade e integridade, na sua diferença e nos seus direitos, liberdades e garantias, perde irremediavelmente e à partida, pois os adversários, que não são minimamente democratas, nem se sentem obrigados a respeitar as normas éticas da participação e da cidadania, vão utilizar essa vantagem competitiva a seu favor, deitando os democratas ao tapete por KO, e logo no primeiro round. Quero eu dizer, que ainda mal pusemos os butes no ringue eleitoral, e já malhámos com os costados no sobrado... Nas sondagens, no acesso aos órgãos de comunicação social, nas mesas de voto, onde só ficaremos representados quase por favor, e em muito diminuído número. 

Simplesmente, a democracia, é o conjunto de leis, instituições, regras de condutas e maneiras de estar democráticas, o que significa não-autoritárias, que um povo constituiu como desejáveis para se conduzir interna e externamente, quer no seu imo nacional como no relacionamento conjuntural e planetário sociopolítico. Ora, todos os partidos do espectro político e legislativo (com assento na Assembleia da República) português, são veteranos da luta pela democracia, exceto o Bloco de Esquerda, fundado há pouco tempo, e muito depois do 25 de Abril-MFA-Povo-Unido-Jamais-Será-Vencido, todavia empenhado intrinsecamente em seguir de perto o mais veterano deles todos, o PCP, cujas origens remontam à arqueologia da democracia portuguesa, ou aos primórdios da clandestinidade. Embrulhados que estamos no celofane europeu, não será fácil deteriorar-se nem ficar fora do prazo de validade, a democracia, tal e qual como a conhecemos, nas suas vertentes clássicas e de após II Grande Guerra. Pelo que, manter e querer usar a semiótica, discurso e estratégias de luta pela mesma, é autêntica manobra de diversão e de empata-progresso; no entanto, qualquer força política que pretenda confirmar-se legalmente democrática através de eleições, executando apenas as suas aptidões democráticas, sujeita-se a ser considerada intrusa e persona non grata nelas. O que é, suis generis, um handicap de notória significação para o efetivo esclarecimento dos resultados.

Enfim, essa ou essas forças (outsiders), vão ser uma espécie de povo judeu para os demais partidos do establishment, ainda hitlerianos, ainda autoritários, arreigados às lutas de barricada como de antimotim, que abdicarão de guerrear entre si e, ante a ameaça que vem de fora, as elegerão como inimigos número-um, e alvos abater, ou sob o desígnio (nacional) excomungáveis, nem que para isso tenham que fazer aumentar o abstencionismo. Como? Não cultivando a cidadania, a atitude democrática, a liberdade de expressão, o esclarecimento das bases, a participação ativa e consciente, a responsabilidade e emancipação populares. Bem como promovendo o ruído, o bairrismo fanático ou intensificando a toxicidade da propaganda. E, diga-se em abono da verdade, somos obrigados a reconhecer que estão a sair-se muitíssimo bem!

Chiça! Lá estou eu a fugir ao tema...   



Joaquim Castanho

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