12.10.2004

Alexandre Carvalho Costa - um portalegrense das letras a quem a memória escondeu o nome

"Os como tu nunca morrem! E se o fizeram
Até à morte, distraídos, recitaram
Os poemas que a seus alunos, em vida, leram
."
Do poema "Saudade - Três Anos de Ausência",
In O DISTRITO DE PORTALEGRE, nº6131, de 17 de Julho de 1986

Porque nada de novo existirá debaixo do sol (nihil novi sub sole) e sabendo que raramente se é original em matéria cujo suporte é sobretudo a memória, baseada no conhecimento enciclopédico, o lema da obra de Alexandre Carvalho Costa, como ele próprio gostava de referir, era "non nova, sed nove", por quanto desde cedo reconheceu que o labor obreiro das coisas da cultura e da linguística é de contínua reciclagem idiomática, semântica, cognitiva, sustentando-se essencialmente não pela sua originalidade, posto que não serão coisas nóveis nem recentes ao povo que tradicionalmente as acolhe e resguarda, mas sim apresentadas em novo formato ou maneira, e aí propostas como factor ilustrativo de alguma mudança na forma de as ver, entender e assumir.
Dessa legitimidade resultou vasta obra que alguns dela entenderam vislumbrar três vectores classificativos ( v.g. José Martins dos Santos Conde, que o enuncia num artigo publicado no Jornal Fonte Nova, nº 9, de 19 de Dezembro de 1984), caracterizados conforme a especialidade que denotavam.
Assim num primeiro vector, onde cabem os 14 volumes dos "Entretenimentos Etnográficos e Folclóricos", os dois volumes de "Lendas, Historietas, Etimologias Populares e Outras Etimologias Respeitantes às Cidades, Vilas, Aldeias, e Lugares de Portugal Continental" e de "Reflexões Etimológicas", as suas "Nótulas Etnográficas e Linguísticas Apresentadas em Expressões Populares", (publicadas inicialmente no "Boletim de Língua Portuguesa" - 1954 e 1957), "Gente de Portugal - Sua Linguagem, Seus Costumes", 3 Volumes, ou "Notas de Divulgação Linguística" e "Filólogos Portugueses e Notas Bibliográficas Desde o século XIX", de publicação fasciculada em rodapé do Distrito de Portalegre a partir de 1946.
Em outro patamar a parte dos estudos acerca da toponímia e antroponímia, de onde fazem especial relevância os trabalhos ou brochuras relativas às origens dos nomes de todas as freguesias e concelhos do distrito de Portalegre, e nele podem classificar-se títulos do cariz de "Toponímia Alentejana", inicialmente publicada no jornal Voz de Portalegre, "Gentílicos e Prolóquios Toponímicos Transtaganos" (1956), "Apodos Tópicos Transtaganos" (1967), "Gentílicos e Apodos de Portugal Continental" (1973), "Antroponómios - Origens e Significação", "Como é a Sua Graça? - Origem e Significação de Antroponómios", que exemplificam o quanto de laborioso se concerne ao procurarmo-nos nas ancestralidades do verbo que nos nomeia e nos dá entrada no universo gregário, sem o qual seríamos simplesmente ninguém.

E numa terceira vertente, as obras adstritas à sua actividade docente, que versam principalmente o estudo da língua e da literatura portuguesa, como o exemplificam os títulos, "Apontamentos de Língua Portuguesa" (Editora Educação Nacional - Porto, 1904), "Ninharias Literárias - Resumo de Algumas Obras dos Nossos Escritores" (Editora Educação Nacional- Porto, 1941), os diversos volumes das "Questões Sobre História da Literatura Portuguesa", quer as das Edições ASA, na Enciclopédia de Estudo (Porto - 1971, Porto - 1972 e Porto - 1977), como as da Livraria Atlântida Editora - Coimbra, 1972, ou As Notas Básicas à Margem da Gramática Portuguesa, edição dos Livros Horizonte - Lisboa, em 1985, cujos conteúdos são inegavelmente de extrema importância para quem se queira (ou dedique) exímio nas manigâncias da comunicação entre as gentes da lusofonia, as ideias da lusatinidade e os reflexos da nossa cultura entre os demais povos, sempre pronta a tomar novas atitudes e qualidades denunciando como nem apenas o tempo é constante (de mudança), como o sublinha "algures" o Luís Vaz da nossa camoniedade, a quem também os contratempos e as sevícias do poder instituído aventuraram na eternidade, fazendo jus a mais uma das grandes notícias versadas na Eneida, de Vergílio, destroçando a pertinácia à vulgaridade medíocre, e, quiçá, denunciando já aquilo que em Carvalho Costa se veio a confirmar: apparent rari nantes in gurgite vasto - ou seja, aparecem raros os nadadores do vasto abismo.
Biografia:
Natural de Alagoa, concelho e distrito de Portalegre, nascido a 31 de Março de 1908,filho de Joaquim Costa e de Maria Antónia Bruno de Carvalho Costa, fez a instrução primária na escola da sua freguesia e exame de admissão ao Liceu de Portalegre, em 1920, em que cursou Letras, e de onde seguiu (em 1928) para a Secção de Filologia Clássica da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, licenciando-se aí a 24 de Julho de 1934.
Consequência das dificuldades sistemáticas e corporativistas que caracterizavam o ensino de então, só vem a ingressar no público depois de tarimbar no privado, tendo passado sucessivamente pelo Colégio Nisense (Nisa, 1934-36), Colégio Nuno Álvares (Tomar, 1937-39), Colégio Contestável (Nisa, 1939-42), Colégio Nossa Senhora de Fátima (Castelo Branco, 1949-54), e no Colégio Elvense (Elvas, 1955-56).
A par da actividade docente, cuja vínculo adquire ao ser nomeado professor de serviço eventual do 1º Grupo do Liceu Nacional de Portalegre, a funcionar antigamente nas actuais instalações da ESEP (Escola Superior de Educação de Portalegre), conforme enuncia uma Portaria de 26 de Setembro de 1926, e após primeiros contactos com o ensino oficial nos dito Liceus de Portalegre (1936), Santarém (1939), Castelo Branco (1943) e Évora (1943), foi também bibliotecário conservador do Museu Municipal de Elvas (1955-1962), bibliotecário da Câmara Municipal de Portalegre em(....???), bem como colaborador do Diário da Manhã, da Revista de Língua Portuguesa, do Boletim da Sociedade de Língua Portuguesa, d’O Distrito de Portalegre, Alentejo (Cabeço de Vide, 1933-34), Notícias de Vila Viçosa (1933), Castelovidense (Castelo de Vide), Brados do Alentejo (Estremoz, desde a sua fundação em 1931), Jornal de Elvas e Linhas de Elvas, e no Reconquista, de Castelo Branco.

Com pergaminhos e provas dadas na multidisciplinaridade, é todavia a filologia a sua grande paixão, conforme o atestam a grande maioria das obras de sua extensa bibliografia, mais ou menos 75 livros e brochuras, posto que haverá ainda três ou quatro por publicar (e todo o espólio por classificar e avaliar), e o explicitaram os seus pares, dos quais Reis Brasil (ou Dr. José Gomes Brás), Paulo Catarão Soromenho, Fernando Falcão Machado, Luís Chaves, Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca, entre outros. Faleceu em .............FALTA DATA!!!!!!!!
Por conseguinte, se, tal como afirmara o seu amigo Luís Chaves em jeito de prelúdio a "Gentílicos e Apodos Tópicos de Portugal Continental" (1973), "o espólio das idades e das suas culturas" é um "estudo cumulativo da história psicológica e linguística, até mesmo da literatura", então a bagagem formativa de Alexandre Carvalho Costa, a multidisciplinaridade e teoria da vida, quer a sua experiência pedagógica, como a do quotidiano convívio, foi sempre muito para além dos "saberes fazer" académicos com que se apetrechou, primeiro para desempenhar funções de amanuense do Governo civil de Castelo Branco, onde Carlos Garcia de Castro o vai contactar a primeira vez a fim de lhe solicitar os préstimos em explicações de Latim e Grego, e depois enquanto docente, articulista, bibliotecário, conservador museológico, filólogo e etnógrafo, amigo, crítico, etc.
Mas irremediavelmente vocacionado ao esquecimento público e institucional porque cometeu em vida o maior crime que os fundamentalistas supõem existir à face da terra (do céu e arredores), os apaniguados da sigla bíblica e defensores do "quem não é por mim é contra mim", que é o de, por lhe bastarem e preencher a existência os pormenores da sua gaia especialidade (a palavra e seus diferentes modos de uso), não se ter ilustrado na política nem ter angariado estatuto de vítima do regime ou de seu subscritor. Aliás hediondo crime este de ser gente a quem o humanismo não se equaciona na sua etiqueta partidária, pois lhe é apostrofada a dúvida rebelde, ou de opositor, mais depressa que a certeza acólita, criando-lhe voluntariosos adversários num lado e outro, demonstrando que isso de semear ventos para colher tempestades é já mentira grossa nos tempos que correm, pois que estar quietérrimo no seu canto ou no embalo das filólogas lides, pode muito bem trazer o mesmíssimo efeito. O que foi sobejamente confirmado por quantos com ele privaram, não só na tertúlia cavaqueira, como os Doutores Francisco Subtil, João Tavares, Manuel Ferreira, Luís Bacharel ou José Conde, mas igualmente os funcionários e alunos dos estabelecimentos de ensino onde exerceu o seu magistério, ou a este vosso apontador de casos, a quem nunca sonegou atenção, ajuda nos tratos do linguajar, nem polimento de etiqueta para as vestes gramaticais.

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