8.03.2010

Por favor, agora não!...


"Há sempre uma solução fácil para cada problema humano – exacta, plausível e errada."

H. L. Mencken

Além dos picanços com as agências noticiosas internacionais, o que vai salvando da falta de assunto as redacções dos órgãos de comunicação portugueses, é, sem dúvida alguma, a necrologia dos famosos; uns mais populares que outros, é certo, mas todos igualmente "grandes perdas" para a nação, destruindo com isso qualquer apetência de qualidade e ética que ainda sobreviva aos não-defuntos, profissionais esforçados e, quiçá!, honestos e competentes, uma vez que aquilo que se lhe adivinha como fado é passarem à história sobre o crivo da indiferenciação, como se a morte resolvesse definitivamente as diferenças de ética e empenho, de estilo e frontalidade, de responsabilidade social e consciência cívica, que em vida os pautou e marcou o seu registo, conduta ou discurso. Há um borra-botas qualquer, que em vida só cagou sentenças e alinhavou a carreira profissional com as linhas da conta bancária, e eis que morrendo, todos lhe tecem loas, enaltecem atitudes e disparates, tornam qualitativamente superior por quanto em vida o condenaram – e criticaram –, incluindo o não querer ouvi-los se emitiam os seus lamechismos deletérios. Mas estão mortos e já não os podem mandar calar, e estes, testemunhando, desforram-se à barba-longa afiançando por factos quanto antes nem sequer palpite era. O que renova e actualiza a tendência mórbida para o cinzentismo salazarista, embora sendo feito em televisões, rádios, Internet e jornais a cores, pelo que muitos garantem não ser a mesma coisa, atirando poeira pròs olhos dos incautos e desprevenidos, ou incapazes de reconhecer que o que estabelece e determina a qualidade ética dos destinos não é o avanço tecnológico do veículo e vias, mas a nobreza daquilo a que se quer chegar...

Isso, e os incêndios. A moda e as contratações e/ou resultados de pré-época. A publicidade enganosa às estâncias de comes-e-bebes e veraneio, ou o marketing territorial para estimular o negócio do turismo à portuga. Tudo o que seja pronto a engolir e pré-formatado, de modo a não induzir em questionações as cabecinhas com quebranto e insolação de quantos estão em férias ou dos outros, que não estando, os invejam na retouça "imaginada". Sim, imaginada, porque vai-se a ver, no fim, até voltam mais cansados do que quando foram de vacanças, e se não fosse o sossego do emprego que os espera, estoirariam de stress, sobretudo agora que as baixas por esgotamento estão muito mais difíceis do que outrora eram.

A despesa pública não desceu conforme "sentenciava" o PEC, e as medidas caíram no saco-roto da incompetência conforme os idos governos já confirmados pelo INE, que trabalha melhor no escabeche de um quadriénio prò outro, embora que ambos passados. O PC do PPD anda inconformado por ninguém o notar com a acuidade com que ele o faz, e apela às horas extraordinárias das Comissões de Inquérito na AR, para compensar da quebra dos 5%, mas os demais não lhe atribuem qualquer valia pela preocupação, visto saberem muito bem quanto ainda é a demasia recebida pelo trabalho que fazem. Os apoios não-contributivos levam catanada grossa, e alguns quadrantes não só acham que é merecida, como tardia e pouco abrangente. Porém, a opinião generalizada é de que tal só conta prò enredo internacional do Times, uma vez que é o único jornal para o qual os políticos ainda vão dizendo aquilo que pensa se chamados à fala, que aos de cá só dizem o que lhes interessa que os portugueses saibam, isto é, propaganda, o que é válido tanto para os da situação como para os da oposição, que alguns insistem afirmar que existe, mas todos sabemos ser como às bruxas do outro, que não acreditava existirem mas que as havia, havia.

Portanto, não se percebe porque é que se anda a pagar balúrdios aos políticos e gestores da coisa pública, quando a solução que encontram para os momentos de crise é a mesma que qualquer sem-abrigo toma quando vai comprar géneros e não tem dinheiro que chegue: não paga, simples e exacto, plausível e justificado – precisa, mas precisamente por isso, não paga. Exactamente o que o governo faz porque precisa de baixar a despesa: deixa de pagar algumas coisas que não afectam o orçamento de quem executa os primados do PEC. E depois chamam-lhe estratégias de contenção da despesa, clarificação das contas, reformas das políticas. Mas se for o sem-abrigo por causa do desemprego que o vitimou a dizer isso no supermercado vai direitinho à choldra... Ora, se fez exactamente o mesmo que os governantes porque é que não é promovido e premiado pelo desempenho? E homenageado? E "laureado" na comunicação em caso de óbito pelo choque térmico? Organizem-se!, que o Mencken já morreu mas também não anda esquecido...


8.02.2010


Inda Benão a Coisa Altera-se

"Só o medíocre está sempre satisfeito."
Somerset Maugham

Por aqui estamos, mais ou menos, todos de acordo: Portugal é uma contínua surpresa – está sempre a mudar a fim de ficar irremediavelmente na mesma. Nunca pára quieto, sobretudo se se depara com alguns prenúncios de mudança, venha ela de onde vier, seja de que quadrante político for, porquanto nisso de esquerdas e direitas, lhe sucede ser como o soldado a quem o capitão mandou rodar os dois braços e mãos ao mesmo tempo, durante dois ou três minutos, ao fim dos quais lhe perguntou «qual é tua mão esquerda e qual é a direita?», obtendo por resposta o singelo e científico «não sei, meu capitão; que vocemessê mandou-mas baralhar!»
Surpresa grada, pois então, que dos banhos à alvenaria a coisa pode aparentar lisura, mas depois vai-se a ver o recheio, e é a mesma tacanhez do costume: duas ou três berlaitadas sem compromisso nem aprumo, à "ora toma que já almoçaste!", a necrologia a bater o ritmo no seguir adiante, ouvindo testemunhos tecendo loas, algumas peripécias constitucionais e a educação ao de cima outra vez, que aquilo que não presta pode tornar-se "recurso recorrente" e pleonasmo democrático para governâncias onde a oposição prima por ser mais do mesmo com outros enfeites. O menino (PC) quer mudar a Constituição e a menina Isabel pondera acabar com os chumbos, numa linha de semelhança onde ecoa o "nada disto é a sério, mas só para entreter e termos todos que falar nas espraiadas tertúlias com tremoços e cuequinha ensopada".
Eu sei que num país onde a revolução e progresso estão no centro tudo é possível... Principalmente que aquele estrato social onde mais ocorreu o chumbo e a raposa, uns porque tinham dinheiro demais e achavam as habilitações literárias e académicas como brejeirice de quem queria ascender socialmente, outros porque careciam de meios ou eram nados e criados num meio em que o trabalho nada tinha a ver com a produção e sustentabilidade económica, seja agora aquele que mais afincadamente se opõe a queda da fundamental base do actual – mas obsoleto – sistema de ensino português, e exactamente esses que se opuseram às modalidades de avaliação que anteriormente sobre a classe docente recaíam. Digamos que é muito difícil de compreender um país cujos cidadãos militantes dos partidos progressistas têm posições e discursos que nem lembram aos dos conservadores mais radicais, profundos e fundamentais, e vêem o desenvolvimento humano, tecnológico e científico como veículo de andar para trás e um entrave directo à concretização das suas políticas.
Não sou fã da menina Isabel e muito menos do PC. Porém também não é por isso que vou deixar de considerar as suas propostas como medidas viáveis e preocupadas com a sustentabilidade sócio-económica portuguesa, uma vez que elas correspondem sobremaneira àquilo que lhe interessa seguir num futuro imediato: o ideal europeu. É inegável que nos países nórdicos em que a avaliação é uma ferramenta de aperfeiçoamento e não de clivagem estão muito mais desenvolvidos e têm planos de estabilidade e crescimento muito mais sustentáveis do que nós. Como é inegável que rever a Constituição num país em que ela não tem o mínimo valor e só serve para pedra de arremesso político-partidário entre os órgãos de soberania, não serve absolutamente para nada, a não ser para aquilo que serve pintar a frontaria de um prédio com o interior em ruínas que ameaça cair desde longa data: ilude em vez de proteger. Adocica mas não esclarece, não aprofunda nem estimula a participação e a cidadania. Enviesa mas não democratiza a sociedade portuguesa, antes a amputa e a desarticula por retalho e mais a suspende perante a efectiva determinação do Tratado da União Europeia. É um tanto-faz que não muda nada e muito menos altera as condições de sustentabilidade social portuguesa, ao contrário do palpite de Isabel Alçada que parece ser a inversão imediata da Lei de Pudder, que dita que tudo quanto começa bem, acaba mal e nos sugere que o contrário também acontecer e com iguais probabilidades, enunciando esta lei sobre a perspectiva cigana de que tudo o que começa mal, acaba bem.
Ou seja, inda benão as coisas alteram-se, incluindo os sentidos e significados dos conceitos, motivos e pretextos, atribuindo qualidades inegáveis àquilo que sempre vimos como abominável, porquanto de tudo quanto foi feito até hoje pelo Ministério da Educação desde longa data, essa mudança seria a única medida positiva com reflexos directos no desenvolvimento, progresso social e sustentabilidade cultural lusófonas, tornando-nos continuamente melhores e mais democratas. Mas mais uma vez, porque isso é benéfico, quase todos são manifestamente contra, esquecendo-se que o que realmente conta em termos formativos e para a sociedade (do conhecimento e informação) não são os canudos, tirados com muitas explicações por fora, mas sim os conteúdos, e esses “conquistam-se” a pulso, no consequentemente exercício diário e das aulas de apoio, se necessárias, e não com chumbos onerosos, inúteis, desmotivadores e desestruturantes. E essa diferença não fará a diferença?

La vida es un tango y el que no baila es un tonto

La vida es un tango y el que no baila es un tonto
Dos calhaus da memória ao empedernido dos tempos

Onde a liquidez da água livre

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Também pode alcançar o céu

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