UM MENINO VESGO
Há pessoas que se deixam arrastar pela desventura,
Outras que se deixam seduzir pela beleza.
Alguns arriscam o destino trágico dos seres
Que se tornam definitivamente adultos!...
Mas em cada assisado
Há sempre uma criança adormecida.
Também tu, meu amigo,
Foste um menino mau como os outros.
Reconcilia-te com esse menino!
Fala ao teu filho com o teu coração de menino...
Mas, lembra-te que:
Falar não é arremessar palavras,
Não é cuspir frases.
Falar é deixar que os silêncios falem.
Tu falas às crianças
Como se tivesses um velho livro na cabeça
E um polícia no coração.
Vês o teu filho sem o olhar;
Vês só a imagem que dele inventaste,
Misturada com a ideia da criança que eras.
E assim,
O teu filho não sabe rir,
Gagueja quando o interrogas,
Não sabe estender-te os braços,
Não sabe olhar para ti,
É vesgo.
Deixa de ser um menino mau, meu amigo,
Estende os braços ao teu filho,
Faz gazeta por um dia e vagueia com ele por aí.
JOÃO DOS SANTOS
Poema escrito durante o Primeiro Colóquio Português de Estrabologia, em Sintra, no dia 21.IV.1968.
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