Os rafeiros ladram e a caravana passa
“Ainda está para chegar o dia em que eu ficarei
chateado quando alguém me elogiar.”
Otto Isch
A coisa dizia-se ao contrário, mas nunca meteu piada nem foi levada a sério por ninguém de bem, defensor da beleza, força e sabedoria… Agora, e com certeza de afianço e garantia, diz-se – e muito bem! – que “quem não tem gato caça com cão”. E cão de pobre resmunga por tudo e por nada. Quando preso, sente-se injustiçado e faminto; então, ladra impotente a quanto mexe à sua volta, indiferente e indiscriminadamente, quer lhe seja agressivo ou benfazejo. Depois, se à solta, fica sem saber que fazer para alimentar-se e, em consequência, ataca todos aqueles que lhe estendem a mão propondo iguarias. Bloga que bloga mas não sabe aproveitar a liberdade ou os meios gratuitos que lhe põem ao dispor para se instruir, valorizar, trabalhar, partilhar, divertir-se ou somente comunicar e integrar-se no meio ambiente que o acolhe.
Acossado, refugia-se no anonimato e secretismo – que, como todos sabemos desde que Orwell o denunciou no seu Down and Out in Paris and London, de 1933 (aliás já traduzido para português, por Miguel Serras Pereira, intitulado Na Penúria em Paris e em Londres, e editado pelas Edições Antígona, em 1985) é o principal sintoma de miserabilidade existencial de qualquer mortal – e morde o suco do seu próprio veneno ou peste emocional. Aquilo que toca e lambe fica igualmente contaminado com a sua doença: a raiva pestilenta. Vítima da sua própria peçonha, ira e demência, desesperado, investe a eito sobre os demais viventes embora estes o desconheçam, ou alguma vez o tenham prejudicado. Professa a obtusidade da cegueira e emerge das profundezas da inveja e frustração para instaurar o caos e a maledicência.
Álvaro Guerra, a propósito da sua privilegiada eclosão no antigo regime, descreve-o em Mastins e Aquilino Ribeiro teceu-lhe caricatura a preceito no Quando os Lobos Uivam. Eça de Queirós mete-lhe A Trombeta nos salsedos queixos e Wilhelm Reich caracteriza-o em Escuta, Zé Ninguém! José Cardoso Pires adjudicou-lhe tanto A Cartilha [do Marialva] como O Delfim e a psicopatologia atribui-lhe larga fatia das suas preocupações científicas. Mas embora a comunicação social lhe dê honras de página em noticiários e colunismos de opinião, os comuns mortais não lhe concedem o mínimo crédito, e isso magoa-o deveras... Cai-lhe fundo! Põe-no a arrastar o ilhós por qualquer nervuda e toca de locomover-se a quatro em todo o terreno! Até na Internet!
(Assim, qualquer um pode constatar que a sua verve não passa de uma verborreia ou manancial de esterco e lombrigas!...)
Digamos que este cão é diversos cães... Que teve azar na vida e nasceu para ser abandonado! Aqueles que o representam negam-se a assumi-lo. Os que o assumem não o assinam. Quem o licencia não lhe aplica vacina. E o dono nega-o três vezes três vezes num mesmo dia, antes e depois do galo cantar.
“São os cães do senhor sem Senhor, que é uma grande e eterna vontade e, também um extenso passado, um obscuro, monstruoso e monótono passado incrustado no tempo dos tempos”, conforme a propósito deles afirmou Álvaro Guerra. Normalmente caluniam, vituperam, esganam, difamam, obstruem, despedaçam, desvirtualizam e empestam tudo e todos mas fazem-no sempre acoitados pelo anonimato das tecnologias da informação. Suficientemente ousados para mentir apenas conhecem a cobardia como método, o boato como fato e a dor de corno por motivação. Para eles a diferença chama-se aborto, a mentira imaginação fértil, ao afastamento dão o nome de desvio, confundem subjectividade com manipulação e pregam deontologias que jamais praticarão. Todavia “por toda a região, vencendo penhascos pedregosos, várzeas, ribeiros, planície, charneca, muros de quintais, forçando as portas e postigos fechados das casas da Aldeia, ultrapassando-a, correndo pela boca dos viajantes e por caminhos e atalhos, espalhou-se a fama dos cães do Senhor. São a guarda da Quinta e põem na alma de quem lá passa angústias de ladrões perseguidos, são a lei, a ordem e o medo que governam os territórios do Senhor, lei, ordem e medo em vigor por toda a parte, penhascos, várzeas, ribeiros, planície, charneca, Aldeia, bocas e corações dos que lá vivem, caminhos e passos que os trilham” (idem, ibidem).
Contudo, sendo alimárias do aqui e agora não passam de uns anjinhos à luz cruel e fria de qualquer bestiário da atualidade, posto que estão tão arreigados ao servilismo que até quando querem ofender alguém apenas conseguem tecer-lhe elogios, à semelhança daquilo que Maomé disse do toucinho como propaganda ao bom gosto, a que nunca ninguém poderá chamar carne de cão por respeito à dignidade e nobreza de carácter desse animal, ou à magistral e dedicatória afeição que lhe concedem os seres humanos, independentemente da sua cor ou raça, credo ou condição física, e aos quais devo encarecidamente agradecer o terem-me colocado no convívio de gente de valor e mérito reconhecido, como os escritores da lusofonia, cujos esforços e empenho, ainda que mais nada tivessem feito pela língua portuguesa, criaram, produziram e difundiram um idioma que serve aproximadamente 200 milhões de utilizadores, vivo e pleno de afetos nos cinco dos continentes habitáveis do planeta e mais bem frequentados pela espécie.
Pode ser muito pouco face à hegemonia de culturas menos ricas mas mais prósperas, fundamentadas na observância esclavagista do mercantilismo majestático da pregação sexista bibliómana; pode. Pode estar cimentado por um universalismo da alma ibérica com raízes alicerçadas nos cultos bárbaros à Deus Sol da origem da civilização indo-europeia; pode. Pode estar em ruínas como os monumentos anteriores à Antiguidade Clássica; pode. Mas é suficiente para nos entendermos enquanto os impérios da modernidade desabam e se abatem no caos dos oportunismos energéticos e ideológicos. E isso basta-nos para a entendermos como uma solução viável nesta crise mundial, e não como mais um problema de desacordo ortográfico.
Portanto, quando há dias atrás, alguém, na declarada intenção de denegrir o êxito e abrangência dos meus textos, poemas, contos e novelas, afirmou que só essa crioulada da morna e do sambinha é que me liam, fez muitíssimo bem em dizê-lo, pois foi o maior elogio que alguma vez me fizeram e ainda está pra nascer o dia em que ficarei chateado quando me elogiam. Obrigado, pois aos que me repudiam e ofendem, porque deles será o reino do anonimato e esquecimento.
Convite para partilhar caminhos de leitura e uma abertura para os mundos virtuais e virtuososos da escrita sem rede nem receios de censura. Ah, e não esquecer que os e-mails de serviço são osverdes.ptg@gmail.com ou castanhoster@gmail.com FORÇA!!! Digam de vossa justiça!
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