QUE DETALHES E PORMENORES,
HÁ-OS PARA TODOS OS GOSTOS, DESDE OS MAIS PEQUENOS AOS MAIORES
«Grandes
poderes, trazem grandes responsabilidades», disse o tio Ben a Peter Parker.
In O HOMEM ARANHA I
A
única diferença plausível e observável entre cultura e propaganda, é que a
primeira admite, integra e inclui a segunda, mas a propaganda exclui,
estigmatiza e instrumentaliza a cultura. Sobretudo e por isso mesmo, se é já de
si difícil perceber como funciona uma mente, ainda que das mais normais e pacatas,
então avizinha-se hercúlea tarefa perceber a dum povo, mesmo que recheado de
paz-d ’almas como é nosso, que é o conjunto – somatório e produto – de cada uma
delas e o entrosamento de todas elas, formando essa amalgama de diversidade
multicultural, que devia também ser integracionista mas prefere ser anárquica,
a que chamam povo lusitano ou português. Contudo, não é: é simples: não
funciona. Porque se funcionasse não estaríamos como estamos, não devíamos o que
devemos, não haveria a corrupção que há; teríamos políticos honestos, frontais
e competentes – e não temos. Nem resistiríamos às pequenas mudanças conforme
resistimos, esperando ansiosamente uma grande e derradeira que nos salve ou nos
atire definitivamente de pantanas, como sucedeu com D. Sebastião, o Encoberto,
e Alcácer Quibir. Não nos oporíamos a repensar continuamente as nossas
prioridades, nem faríamos orelhas moucas às sugestões e palpites do
conhecimento universal acerca das alterações que temos de efetuar para melhorar
a acuidade observativa, lucidez técnica e objetiva, disponibilidade mental e
sentido prático, espontaneidade e eficácia de conduta. Ou seja, estaríamos
dispostos e disponíveis para contribuir eficazmente para o desenvolvimento
coletivo, aumento da qualidade de vida, garantir razoável sustentabilidade
socioeconómica e máximo bem-estar, e não estamos. O que denota que essa
resistência não é apenas resistência, mas incapacidade de nos adaptarmos a uma
sociedade moderna e aberta, democrática e emancipada, consciente e responsável,
insistindo teimosamente no modus operandi da teimosia infantil e explicitado sentimento de
inferioridade caraterísticos da mentalidade provinciana e pacóvia que grassou,
e grassa, de norte a sul, desde o tempo dos santacombadões do está tudo bem
assim e não podia ser de outra maneira. Emperrou. Está atravancada de monos e
trastes como estaria qualquer sótão arrumado por dez milhões de macacos à
solta. Coisa que se nota principalmente nas periferias das cidades periféricas
(ou do interior), onde a economia paralela floresce e prolifera, de forma
escorreita e destemida, à vista de toda a gente, e sob o beneplácito e agradado
olhar das autoridades, que se estão literalmente nas tintas prò assunto…
Fiscalização?
Nem vê-la. Que estão escalmorrados contra o governo que lhe cortou nas
mordomias e horas extraordinárias. E os populares? Bhhhaaa!... “Na terra do bom
viver faz-se o que se vê fazer”, justificam-se, atirando o olhar para os
exemplos que vêm de cima.
O
governo que temos foi o governo que escolhemos (ter), e a esta altura do
campeonato não vale a pena rabiar, uma vez que ele entrou na descida que
antecede a reta da meta, e não é agora que se vai conseguir aquilo que não se
conseguiu no apogeu do mandato, que é deitá-lo a baixo, ou fazer com que
melhore o seu programa e a execução dele, pelo que falar contra a ação
governativa e sua composição só lhe dará força, motivação e renovação de
ideias, dando subscrição plena à sentença de que aquilo que não tem remédio,
remediado está. Até porque se lhe esgotou a criatividade e imaginação, coisa
que também tem limites mesmo para quem é perverso e maléfico, quer o reconheço,
quer não, inclusive por se lhe haver secado a fonte de inspiração típica dos
navegadores à vista da costa, que é a oposição, que entrou igualmente em crise
de gestação e se encontra prestes a sentir as dores de parto, pela ameaça dos
movimentos e novos alinhamentos políticos que se aprestam a abalroar o
establishment ocidental (e ocidentalizado). Tanto por influências históricas
judaico-cristãs, como pelas anglo-saxónicas do novo-mundo: via UEA, UE, China,
India, Brasil, Canadá ou Austrália. E até da Islândia, que deu um pontapé no
seu desregrado estado para rumar em direção à sustentabilidade, ao
desenvolvimento e ao são convívio com a natureza, por mais vulcânica,
ameaçadora, fria, agreste e exigente que ela seja.
Vai
daí, contentamo-nos em prolongar o carnaval para além dos cinco dias que dita o
entrudo, e assobiamos prò lado, alegrando-nos por saber que há ainda quem
esteja pior do que nós, indo buscar felicidade à infelicidade alheia. Vemos no
que deu o CHARLIE e não arriscamos. Vemos uns filmes. Assistimos em direto à
entrega dos óscares. Desabafamos no futebol. Temos um fado sempre na grafonola
digital. E um de cante alentejano próximo da máquina, que nos pode apetecer uma
sesta. Fazemos zapping amiúde, e
guardamos a genuína apreensão sobre o futuro para os analistas da meteorologia,
que o pintam com avisos de curto prazo, desde o vermelho ao verde com amarelo
das rosas repolhudas e amistosas. Podíamos tomar as rédeas ao destino, mas não
tomamos, que isso dava-nos um grande poder. E um grande poder é um grande
encargo, uma enorme responsabilidade, como dita o herói da pequenada a quem a
teia teceu a segurança, o voo mas também o medo e o criancismo. A superstição.
A vida tramada. E acomodamo-nos amuados.
Bom…
Mas AINDA temos a liberdade de expressão, se dirá. Não, não temos. Usufruímo-la,
executamo-la porque veio/vem de fora, com a Internet. Senão andaríamos todos e
todas a comer o pão por conta, ganho com a boca pequena, que é como reza quem
se ajoelha por necessidade. E será que ela, a necessidade, depois de nos aguçar
o engenho, começou também a burilar-nos o gosto? É caso para começar a ficar
preocupados… É que para quem teme a mínima alteração ou mudança nos detalhes,
com uma inversão tão radical, dava-lhe alguma coisa ruim. Oh, se dava!
Joaquim Castanho