CINZAS FULGENTES
Porque feminina, logo plural
Como a madrugada joanina,
Sei duma estrela estival
Que até ao sonho ensina
A ser o que é, unicamente,
E não outra coisa qualquer;
Para quem olho como gente
Mas vejo somente por mulher.
Tem o jeito mágico duma fada
E guarda no olhar esse elixir,
Com que a eternidade é nada
Pelo instante de um devir;
Dum estar que o viver transforma
Tirando-lhe tédio e ilusão,
Pondo o caos com essa forma
Que consideramos ter a paixão.
Pois por ela já de mim não sou
E daquilo que fui nada me sobra,
Que quem ama o ser à luz deitou
Até lh’arderem as cinzas…
– e obra!
Joaquim Maria Castanho
DO NÚCLEO, A ESPIRAL
É difícil o despovoar dos sonhos cimentados
Crescidos no dia a dia ante os teus gestos
Como verbos de arrumar em livros catalogados
Novos, reposições, como registos, e lestos
De pronto se autorizam e te obedecem servis…
Por mim o digo, que no contento de tuas mãos
Me andam ajeitados os puros sentimentos
Balançando nas ondas de teus cabelos, sutis
Vaivéns de quem alisa recatados desvãos
Onde moram os secretos anseios e alentos.
Pudera eu ser o teu andar! Pudera eu ser, então,
Todo o ar que respiras para ir até cada poro teu,
Invadir de manso tua íntima pele, e na sofreguidão
De ver-te cirandar, rodopiar em mim até ao céu!
Joaquim Maria Castanho