Sabe-se hoje que as candidaturas do primeiro concurso relativo ao programa Porta 65 jovem foram 3.561. O governo anunciara uma expectativa de 20.000 candidaturas. Este número demonstra, portanto, o rotundo falhanço deste programa, no que concerne ao apoio ao arrendamento para jovens. Demonstra a ineficácia do programa em relação aos objectivos que, à partida, visava cumprir.
E o que é mais problemático é que as regras deste programa, que substituiu o IAJ (Incentivo ao Arrendamento Jovem), foram criadas justamente com um objectivo: reduzir substancialmente o apoio e o número de jovens apoiados pelo Estado no seu acesso à habitação, por forma a poupar uns milhões de euros, contributo para as exigências de défice da União Europeia, défice, esse, endeusado pelo Governo português, à custa de direitos e da despromoção da qualidade de vida da população.
Por isso o porta 65 jovem diminuiu temporalmente o apoio de 5 para 3 anos, prevendo a diminuição quantitativa progressiva do apoio ao longo desses 3 anos.
Por isso o Porta 65 jovem desligou-se completamente da realidade e previu um tecto máximo de valor de renda, muito abaixo daquele que é praticado nas várias localidades deste país. Quando prevê uma renda máxima admitida de 340,00 euros para um T0 ou um T1 em Lisboa, ou de 220,00 euros para o Porto ou Setúbal, está a impossibilitar de forma exponencial os jovens com acesso ao programa, não porque não tenham dificuldades económicas, não porque não tenham idade para a candidatura, mas pura e simplesmente porque não conseguem encontrar uma casa para arrendar por esse valor. Os valores de renda praticados no mercado são muito superiores.
A esta realidade o Governo argumenta que se pode estar aqui perante um mecanismo que levará à baixa de preços de arrendamento. Nada mais falso. O que o Governo acaba de criar é um mecanismo que fomenta a fuga fiscal, na medida em que fomenta valores contratuais de arrendamento falsos, para possibilitar acesso à candidatura ao porta 65 jovem, e a outra parte da renda, não declarada, ficará à margem de qualquer recibo e portanto não declarada para efeitos fiscais.
Considera o Governo que, se forem essas as circunstâncias, os cidadãos serão polícias e delatores uns dos outros e que poderão sempre denunciar estas fraudes. Não deixa de ser curioso que o Governo altere o IAJ com o argumento, como de resto fez com outros subsídios, de que havia muitas situações indevidas na atribuição desses apoios (assumindo a sua inqualificável incapacidade de fiscalizar a atribuição dos mesmos) e depois crie um programa altamente restritivo e até incentivador de fraudes.
Mas este critério desadequado do valor máximo de renda admissível tem ainda outra consequência preocupante, que se traduz no afastamento dos jovens dos centros urbanos, para procurar habitação mais barata nas periferias, fomentando-se, assim, problemas graves de ordenamento do território e de mobilidade que se procuram inverter, mas que são incentivados por programas deste tipo.
O direito à habitação é um direito constitucionalmente consagrado, mas através do fim do IAJ e da sua substituição pelo Porta 65 jovem, o Governo contribuiu para dificultar o acesso à habitação para os jovens deste país.
O apoio ao arrendamento jovem é um instrumento fundamental para promover a independência dos jovens e para garantir o seu acesso à habitação. Com a dificuldade de aceder a esse direito, os jovens retardam as suas opções de constituir família e cá estamos perante mais um exemplo de como o Estado dá com uma mão e depois vai logo retirar com a outra, se pensarmos nos apregoados (mas diminutos) apoios à natalidade, mas quando toca a garantir dignas condições de vida, para as pessoas fazerem opções de ter filhos em consciência o Governo é exímio em retirar e diminuir tudo, como na habitação.
E isto é tanto mais relevante e elucidativo quanto neste país o desemprego dos jovens é uma realidade crescente, e designadamente entre jovens qualificados. E aqueles que encontram emprego sujeitam-se a salários vexatórios, especialmente se comparados com os de outros jovens de outros países da União Europeia.
É triste verificar como este PS encara os apoios sociais como um privilégio, quase como um favor que o Estado faz, e não como um direito dos cidadãos e um dever do Estado para lhes garantir acesso a questões essenciais, para lhes garantir igualdade de oportunidades, para lhes garantir dignas condições de vida.
É por isso também que para o programa Porta 65 jovem, tal como para outros apoios, o Governo criou um processo de candidaturas altamente burocrático, contrariando toda a lógia simplex com a qual se procurou vestir politicamente, tentando passar uma imagem de grande aproximação do Estado aos cidadãos, o que de todo se prova não constituir uma realidade generalizada.
Tal como o Governo recuou, como não podia deixar de ser, na absurda ideia de pagamento da actualização de pensões durante longos meses, deve também recuar no Porta 65 jovem e promover a sua urgente reavaliação, por forma a garantir aos jovens deste país, que dele precisam, um verdadeiro apoio no acesso à habitação. O Governo não pode continuar a virar costas à população. Os portugueses estão
a pagar um preço demasiado caro, nos índices de desemprego, na pobreza cimentada, na falta de direitos básicos que estrangula este país e o desprestigia a todos os níveis. É tempo, pois, de reforçar exigências que o Governo deve a este povo.
Declaração política da
Deputada Heloísa Apolónia
Sobre o Porta 65 jovem
10 de Janeiro de 2008
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1.11.2008
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