10.16.2008




Declaração Política sobre

As responsabilidades do Estado nos passivos ambientais e sociais causados pela exploração de urânio

Pelo deputado Francisco Madeira Lopes, em 15 de Outubro de 2008





No próximo Domingo, dia 19 de Outubro de 2008, o Estado português sentar-se-á, simbolicamente, no banco dos réus de um Tribunal Cívico, reunido em Nisa, que apreciará as responsabilidades do Estado Português face aos passivos ambientais e sociais causados pela exploração de urânio em Portugal ao longo de muitas décadas.






É sabido como a exploração de urânio em Portugal, ao mesmo tempo que criou riqueza para o país e deu lucros às empresas que o exploraram, também deixou um pesadíssimo passivo ambiental e social atrás de si com a contaminação radioactiva de solos, através da deposição incontrolada de toneladas de resíduos acumuladas em escombreiras e barragens, contaminado também aquíferos e constituindo um gravíssimo perigo de saúde pública para os mineiros, suas famílias e as populações das zonas das minas, designadamente na Urgeiriça no Distrito de Viseu.






Mas, se por um lado, felizmente, o passivo ambiental ali existente conheceu, nos últimos anos, alguns desenvolvimentos, muito graças a quem denunciou esta vergonhosa situação e a quem “Os Verdes” deram voz na AR, exigindo investimentos para a resolver e, adicionalmente, para compensar aquela região e seus habitantes com o desenvolvimento sustentável a que também têm direito, pese embora estes ainda estejam longe da sua total resolução, a verdade é que, já no que toca ao passivo social e laboral, constituído pelo risco agravado de contraírem doenças do foro oncológico, neoplasias malignas, designadamente cancro de pulmão,que afecta muitas centenas de pessoas e que já causou a morte a várias dezenas de trabalhadores das minas e seus familiares, nesse campo, a recusa na assumpção das responsabilidades tem sido ainda mais flagrante!






Em Março deste ano, o PS demonstrou, mais uma vez, uma total insensibilidade social, também relativamente a este problema, ao chumbar várias iniciativas legislativas destinadas a dar um passo importante no reconhecimento do direito a todos os ex-trabalhadores das minas de urânio e da ENU, independentemente do momento em que cessou o vínculo à empresa, a gozarem do regime específico de pensão de invalidez e velhice de 2005 que reconhece a especial perigosidade e danos a que estiveram sujeitos todos os trabalhadores, quer os de fundo de mina quer os de superfície, por exposição prolongada, ao longo de anos, ao minério radioactivo.






Infelizmente esta questão não se fica, no plano social e de salvaguarda de saúde pública, apenas pelos direitos laborais dos trabalhadores, de todos os ex-trabalhadores. Também os seus familiares pela coabitação nos bairros operários a escassos metros das minas ou das escombreiras, muitas vezes habitando em casas construídas, elas próprias, com materiais radioactivos e que lhes foram vendidas pela própria empresa apresentando níveis de radão muito acima dos limites máximos admissíveis, também os seus descendentes directos, já que os efeitos, infelizmente, podem passar de geração em geração, sofrem o perigo e partilham deste pesado passivo ambiental e social que marcou e marca toda uma região afectada.






Para com todas estas pessoas são justamente devidas da parte do Estado uma atenção e um respeito que têm faltado. Na total recuperação do passivo ambiental; no acompanhamento médico, rastreios e vigilância; na integração de todos os trabalhadores afectados; na devolução de oportunidades de desenvolvimento seguras e sustentáveis àquela região: em todas estas matérias o Estado está em falta e tem de responder por tal.







E por tudo isso o Estado português irá ser acusado no próximo Domingo em Nisa numa iniciativa promovida por várias associações locais e nacionais, com o envolvimento de mineiros, ex-mineiros e suas entidades representativas.






Mas este fórum não se limitará, certamente, a debater os passivos e responsabilidades públicas existentes. A sua realização em Nisa relembra-nos a existência de interesses em iniciar a exploração de urânio na área daquele Concelho do Norte Alentejano perante os quais o Governo se tem mostrado muito pouco claro.






Depois de Viseu, Guarda, Coimbra e Castelo Branco, é agora Nisa quem está na mira da exploração de urânio. Um concelho que, dotado de enormes potencialidades de desenvolvimento sustentado nos seus recursos naturais endógenos, no património histórico, natural e paisagístico, nas Termas da Fadagosa, no Geopark Naturtejo e no Tejo Internacional, nos produtos agro-alimentares como o famoso queijo de Nisa, no artesanato e no turismo, é nestes que aposta, e bem, para fixar as populações no seu território e combater a desertificação que o ameaça, como soluções sutentáveis, seguras, de longo prazo e que assentem nos agentes económicos da terra e podem trazer riqueza para todos.






Face a interesses económicos e empresariais que de vez em quando vêm à superfície revelando o desejo de ali iniciar um projecto de mineração uranífera, seria fundamental que o Governo esclarecesse, o quanto antes, se existe de facto a intenção de permitir a exploração de urânio em Nisa. A questão fundamental, do ponto de vista de “Os Verdes” é pensar se, face ao que a história da exploração de urânio em Portugal demonstrou, face aos impactos e perigos que esta apresenta, face a um enorme passivo existente noutras zonas do país, se antes de resolver integralmente todos os graves problemas existentes, se se pode ou deve pensar, desde já, em criar já um novo problema.






“Os Verdes” saúdam pois, finalmente, a iniciativa que várias associações tiveram de realizar o debate no próximo domingo em Nisa e exortam o Governo a vir a público manifestar qual a sua posição relativamente a esta matéria.

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